ENIGMA E POSIÇÃO DO ANALISTA DIAZ Guillermina Possivelmente porque ressoa ainda em mim, aquela enigmática frase com a que Freud definia sua descoberta: NÃO SABENDO QUE O SABE, ACREDITA QUE O IGNORA, é que acho interessante colocar, no Congresso da Convergência, um trabalho desde a vertente do enigma. No entanto, o que é um saber... sem saber...? é um ENIGMA entre outros. Um ENIGMA entre outros. Houve um tempo em que, servindo-me da letra do romance de Jensen "A Gradiva" e seguindo uma proposta de Lacan no seminário do Ato Psicanalítico(1) pude situar diferentes modos de aparição do enigma. Encontrei, assim, três modos de interrogação que, por sua vez, coloquei em relação com três tempos da cura. Mencioná-los-ei rapidamente: O enigma é uma enunciação que, em tanto não
encontra nunca um enunciado tal que o recubra totalmente, deixa aberta
as condições não só de acesso ao inconsciente,
mas tembém (e acho que isto é decisivo) a função
da causa. Se a clínica psicanalítica é "o que se diz numa análise", podemos interrogar aquelas situações onde o que se diz não abre a dimensão do enigma que propõe o "que se diga, fica esquecido, atrás do que se diz no que se escuta" .(3) É como se fosse possível acharmos o relato dos fatos em si, fechados sobre si mesmos, "o fato do fato". Então antecipo uma pergunta: É possível que um relato não fique suspenso do enigma da enunciação? Lembro-me de um jovem, bem disposto de palavras, de quem tomarei um trecho de entrevistas preliminares, que me levou a pensar a relação ou a tensão entre o enigma e o romance familiar, visto que este último, parecia estar ausente para o jovem. Um episódio de impotência foi, segundo seu dizer, o desencadeante
que o leva à consulta. Sua carta de apresentação:
... e... "não aconteceu nada". Jovem profissional, de
sucesso com as mulheres, durante a época de sua puberdade tinha-se
defrontado com uma resposta arrasadora do real: duas perdas importantes
aconteceram nessa época: a morte de um ser querido e um exílio
familiar imposto eram trazidos à consulta como dados de uma história
contada com uma certa indiferença ou inércia. Descreve,
sem deixar de mostrar uma certa exterioridade. A história que conta
não lhe pertence, não tem tido nenhum encontro com ela.
Não consegue apropiar-se de uma lembrança. Inclusive o tom
com o que o enunciava era mais bem adormecedor. E essa mesma posição que ele conta de sua história é a que tem com a consulta. Ali descreve e preserva uma certa exterioridade. Como se olhasse desde fora. Sustentemos, por enquanto, a hipótese que o enigma estabelece
uma brecha entre saber e gozo que permite achar o sulco para o encontro
com alguna verdade. De que maneira achar essa dimensão enigmática
que surge da falta de adequação entre enunciação
e enunciado, se o que acontece a alguém é que "não
lhe acontece nada" e isso não o interroga? Corte ou sutura? Não era que a eficâcia da intervenção do analista sempre é por corte? Será essa uma resposta ao dizer enigmático e para mim quase incompreensível daquela afirmação de Lacan no Seminário Le Sympthome quando diz "por algum lado lhe ensinamos a costurar, a fazer costura entre seu sintoma e o real, parasito do gozo... o que é característico de nossa operação" .(4) Ou talvez simplesmente seja necessário assinalr que quando esse
jovem produz esse sonho, já está incluida na transferência
a abertura em direção ao caminho da interrogação
pelo desejo. Se a função do desejo do analista não pode dizer-se mais do que com um x, é porque há uma dimensão enigmática do desejo cuja lógica se mostra na especificidade de nossa prática.
|